sexta-feira, fevereiro 27, 2009

Desafio: os três anões (12)

Um dia, igual a um outro qualquer, com a particularidade de se tornar diferente, Bocas enveredou numa viagem estranha. Estava deitado, junto com sua linda esposa, quando começou a ser chamado. Achou deveras estranho a voz de sua avó, que havia partido para outras paragens há cerca de doze anos, estar tão presente, tão clara. Não, não poderia ser um sonho, afinal de contas era uma voz tão clara e viçosa, como aquela que em criança o retirava das suas brincadeiras para o almoço, o lanche ou o jantar! A saudade que a voz lhe causou, actuou de tal forma no seu raciocínio que acabou por lhe causar amnésia, esqueceu que ela já não estaria entre eles e começou a caminhar no sentido de procurar essa voz que, a cada passo dado, mais próxima, mais clara e mais meiga se evidenciava. A certa altura deparou-se com uma luz resplandecente e, por entre esses raios luminosos que ofuscavam a sua visão, conseguiu vislumbrar vários vultos, todos eles com vestes brancas tão cintilantes que quase se tornavam transparentes. O seu olhar cruzou-se com um desses seres de luz e, mesmo estando o seu olhar ofuscado com tanta luminosidade, sentiu que…sim era sua linda e adorada avó que o tinha encaminhado até aquele local. A emoção era de tal ordem que as lágrimas começaram a correr pela sua suave face, como um riacho que flui, calmamente, sem nenhum obstáculo. A sua avó sorria, aquele sorriso que ele tão bem conhecia, abrindo-lhe os braços na ânsia de o abraçar. Sem mais esperar Bocas, correu e abraçou-a intensamente. Nesse momento sentiu como que se estivesse a fundir com o ser luminoso que abraçava, preenchendo-se com uma paz que nunca havia sentido, mesmo que a sua vida tenha sido sempre bastante serena. Seguidamente, de mãos dadas, começaram a rodopiar. Rodopiavam e sorriam, tal como faziam em tempos passados. Mas! Seria mesmo em tempos passado?! Era tudo tão real e presente, que lhe dava a sensação de ter feito uma viagem no tempo. Uma viagem ao passado, com a singularidade de estar num local tão belo que se assemelhava às descrições do paraíso. A certa altura, deparou-se com a serenidade dos restantes seres que os observavam, com um olhar de alegria pura, como se fossem as testemunhas da concretização de um sonho. Bocas parou e o seu olhar tornou-se sério e surpreso. Todos os presentes rodearam-no e deram as mãos formando um círculo. A luz começou a intensificar-se mais e mais, até que sentiu-se desmaiar. Não que as forças lhe faltassem, sentia sim uma explosão de bem-estar e fusão para com o todo que o fez ficar sem qualquer reacção, no seu pequeno corpo não habituado a tal frequência energética. Durante o seu desfalecimento sentiu-se descer, aliás sentiu que o levavam em braços até ao seu quarto, no sapato n.º 32, onde vislumbrou, nebulosamente, a sua esposa a dormir, tranquilamente. Quando sentiu que o haviam pousado, com cuidado, na sua macia cama, sorriu, mais uma vez, para o rosto que continuava a observar, a sua amável avó. Continuou a dormir e quando alvoreceu contou o sucedido à sua amorosa esposa que o inquiriu da veracidade do seu relato. Bocas insistiu: “Sim, estive nos braços da minha avó e foi tão bom voltar a senti-la, a ouvi-la.” Sua esposa encolheu os ombros e deixou-o a viajar nos seus próprios pensamentos.

Carla Madureira de Serenidade

14 comentários:

  1. Que bonito que foi ler e sentir tanta luz...gostei muito! Beijos.

    ResponderEliminar
  2. Que bom não se destrinçar entre o que a dita "realidade" e a imaginação ou o entrar num estado alterado de consciência. É que ambos são tão reais como qualquer outra coisa.

    Belo conto do fantástico.

    Um grande abraço

    José António

    ResponderEliminar
  3. Minha Querida,
    Sei que as vezes na euforia da vida esquecemo-nos de nos....por isso venho convidar-te para um pouco de diversao hoje no meu "Gostar de Viver"....muita musica!!!!
    Beijinho doce

    ResponderEliminar
  4. tá muito lindo! Parabéns!

    bjts

    ResponderEliminar
  5. Carla,

    uma saída do corpo cheia de amor e alegria! Amei!

    Beijinhos

    ResponderEliminar
  6. Serenidade luminosa... sonho lindo.

    Bjs

    ResponderEliminar
  7. Queridos amigos,

    obrigada pelas vossas palavras de carinho.

    Que bom que gostaram e sonharam.

    Serenos sorrisos

    ResponderEliminar
  8. Muita luz. Brilhante o conto.

    "Sua esposa encolheu os ombros e deixou-o a viajar nos seus próprios pensamentos."

    E fica a pergunta: para onde terá ido a seguir? Acho que este pede novo conto ou "bis" como costumamos dizer ;)

    Bjs.

    ResponderEliminar
  9. Carla,

    Cá está a Serenidade na estória... Por vezes são pequenas coisas que nos deixam assim, com um sorriso no rosto e paz no coração.

    É mt bom ter-te por aqui neste desafio, obrigada por participares e por te teres mantido perto.

    Beijinho sereno

    ResponderEliminar
  10. Parabéns à Carla pelo conto.

    Muito original!

    Beijinhos

    ResponderEliminar
  11. fraternidade.
    bonito conto para os nossos avós.

    ResponderEliminar
  12. Uma história que nos prende. adorei!

    ResponderEliminar
  13. Querida Carla,

    Só hoje pude vir ler e comentar as histórias mais recentes deste desafio... Que beleza! Grande abraço,

    Isabel

    PS - O José António é que já cá tinha passado...

    ResponderEliminar
  14. Olá.


    Há tanta realidade na fantasia, quanta fantasia na realidade...

    Parabéns. Muito bonito.

    ResponderEliminar

Recebo as vossas palavras de coração...